Entre o Céu e o Inferno – Revisitando DmC: Devil May Cry

  23/10/2014 - 15:33   devil may cry, dmc,  
 

- Nossa, meia hora de cutscene aí.
- Por que você acha que eu tava skipando tudo até agora? Só tô assistindo essa porque tá perto do final.
- O que tá acontecendo? Esse cara é o vilão?

Explico a ela o que estava entendendo da cutscene que precedia a última batalha do jogo.

- Nossa. É tipo… fanfiction.
- EXATAMENTE!

A melhor analogia que encontrei para definir o novo (ou nem tão novo) Devil May Cry é que, assim como o jovem Dante, ele é igual a um adolescente: possui o coração no lugar certo, mas a cabeça fora do lugar; e por mais que todas as suas intenções sejam boas, ele não consegue evitar ser um tanto prolixo, irrante, ou simplesmente nojento de vez em quando.

Isso não o torna ruim, nem de longe: só quer dizer que, entre todos os momentos de ser sensato e divertido, às vezes ele vai ser desagradável sem qualquer motivo aparente além do simples fato que ele não sabe ser melhor do que isso.

DmC pode ser facilmente compreendido como dois jogos diferentes em um só: um bom e um ruim. O bom é muito bom. O ruim não é muito ruim, mas se torna um belo empecilho, pois sempre que ele aparece sua única função é te lembrar de como você gostaria de estar experienciando o bom agora.

O bom se refere à parte onde o mundo pairava de ceticismo: a ação e o combate. A britânica Ninja Theory era conhecida por sua proeza técnica e artística, e não por sua primazia em ação – e felizmente, isso foi contornado. O combate em DmC é empolgante e divertido, sendo menos técnico que seus antecessores e mais focado em variação e oportunidade. Armas extras são empunhadas ao segurar de um botão, e um gancho puxa ou te impulsiona aos inimigos, essencialmente tornando os combos mais acessíveis até aos que não tem tanta noção de momentum. É um jogo para todos.

O ruim se refere exatamente ao que podia ser esperado da Ninja Theory: uma história verborréica e mal-escrita, com uma puerilidade juvenil quase ultrajante; plataforming e exploração de ambientes que seguem a lógica de brinquedos infantis de formas e cores, e uma constante necessidade do jogo de se sentir mais importante que o jogador. O novo Dante é Jesse Pinkman se este fosse um mal personagem em uma fanfiction escrita de um garoto de treze anos. O desenvolvimento da história é arrastado, as cutscenes sao desnecessariamente enormes e sua tentativa (tentativa?) de tratar temas sérios é mais ridícula e vergonhosa do que as postagens daquele seu amigo reaça no Facebook.

Eu não vi a história até o final: quando chegou a uma parte onde a manipulação de uma sociedade se baseava em um refrigerante chamado “Virilidade” que vinha do corpo de demônios obesos, rolei meus olhos e pulei todas as cutscenes desde então. DmC não compreende nada do que critica (se é que tenta criticar algo), apenas bravejando ao alto bobagens vazias a lá “capitalismo é ruim!”, algo que não valia o meu tempo. Não era obrigado a aturar aquilo, e quando decidi não mais aturar, so melhorou o meu divertimento com o jogo.

O esquema de plataforma e exploração é a parte onde o jogo mais mostra o seu respeito ao original, o que não é exatamente a melhor das ideias, principalmente quando você lembra que o primeiro Devil May Cry saiu em 2001 e pular em plataformas com aquela câmera fixa passava longe de ser agradável. Navegar os ambientes na maior parte das vezes se resume a pular de um pedaço de entulho voador ao outro, e utilizar o gancho colorido correspondente na hora certa. Não é ruim, mas também não e bom: testa apenas sua paciência e obediência e não tem qualquer outro motivo para existir além do fato que precisava ter alguma coisa. Aí eu pergunto: pra que se ater a um modelo tão arcaico ao invés de tentar algo novo, visto que o original nem era bom nesse quesito? Aliás, PRA QUE manter plataforming se ele não beneficia em nada?

Mas uma coisa é, de fato, inegável: DmC possui um forte apelo visual. Eu percebia pelo olhar de quem tava por perto. Desviavam os olhares, fixavam vez ou outra, e ficavam observando a ação na tela, curiosas, fazendo perguntas. Mesmo em meu notebook bem modesto, o jogo rodava bem e, excluindo os longos loadings, se apresentava melhor ainda. Nesse quesito, é onde o trabalho da desenvolvedora seria o mais previsível, e é um previsível bom. Já a trilha sonora, bom… acho que dá pra dizer que se encaixa ao jogo. Mas não, já passei e não tenho qualquer saudade da época que eu conseguia ouvir “Banda De Butt Rock Genérico Qualquer Coisa Que Talvez Lembre Um Pouco Marilyn Manson” e achar aceitável.

No fim, os erros de DmC pode ser resumido em um grande só: a sua prepotência. É um jogo que, de forma arrogante, se considera mais importante do que o jogador, obrigando-o a aturar os seus detalhes mais irritantes pelo simples fato de que ele quis ser assim. Não me leve a mal: eu adorei DmC. Eu continuei jogando até o final por puro divertimento (o que me parece cada vez mais raro) , e queria até rejogá-lo após terminar. Mas eu não tenho a menor paciência de ter que passar pelas partes ruins de novo para encontrar as partes boas.

Eu não me imagino tendo o menor saco para aturar novamente sua história horrenda, seu plataforming sem graça, e suas constantes e extensivas interrupções com cutscenes que vinham como um balde de água fria cada vez que o jogo achava importante me jogar mais um pedaço de historinha (e loading com ele) que eu ia fazer questão de passar o quanto antes. É uma dissonância absurda, que me faz adorar todos os momentos onde estou fatiando monstros e ter calafrios ao ver o último finisher e imaginar o tédio que enfrentarei até a próxima leva de inimigos. Era como se alguém arrancasse o controle de mim à força e decidisse que só depois de tantos minutos eu ia poder voltar a controlar o jogo que eu estava jogando.

Se eu reclamo de DmC, é porque eu gostei muito dele, e só imagino o quão melhor teria sido a experiência se ela fosse apenas centrada em suas forças, gerando momentos positivos, ao invés de parecer dois jogos diferentes coabitando (desarmoniosamente) um mesmo sistema. Em seus bons momentos, DmC é ótimo. Fatiar monstros e ser criativo com os golpes e combos é uma ótima diversão. Só é uma pena que tudo entre uma parte bacana e outra parece uma leve perda de tempo, quase como se eu estivesse sendo penalizado.

Então, como já havia mencionado, DmC é um adolescente: alguém passional, com boas ideias e a melhor das intenções, mas se acha o dono do mundo e às vezes pode parecer levemente insuportável. Vale a pena conhecê-lo, sim. Só não espere que ele seja muito maduro.

Sobre

Rodrigo "Rod" é de Salvador, Bahia. Estuda psicologia mas finge ser comunicador. Acha que entende alguma coisa sobre design de games.
  • Rafael Soares

    Rod meu garoto, sempre um bom texto vindo do senhor!!!!
    Agora mesmo sabendo que essa seria uma função do Neozão, quero ler um texto seu sobre o Metal Gear Rising.

    • Twero

      Mas quem também manja das Metal Gearias é o Guerra, tanto é que foi ele que analisou o game.

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