Qualé a desse tal de… Hotline Miami 2: Wrong Number

  16/03/2015 - 16:55   hotline miami 2, review,  
 

Se você está lendo isso, provavelmente já conhece Hotline Miami. Talvez a sua dúvida seja saber que tipo de sequência Hotline Miami 2: Wrong Number é. Será que é uma sequência tipo Uncharted 2, que melhora basicamente tudo do original? Será que é tipo Jak 2, que perde a alma e estraga tudo que o original tinha de bom? Ou será que é tipo Super Mario Galaxy 2, que é tecnicamente mais do mesmo, só que ainda melhor?

Nenhum desses. Hotline Miami 2 é uma sequência no estilo de Super Mario Bros 2. Sim, a versão japonesa. O nosso “Lost Levels”.

Sim!

Antes que você me xingue, deixa eu explicar: Super Mario Bros 2 é o tipo de jogo que parece mais uma expansão do que uma sequência, mantendo a mesma estrutura do original sem grandes mudanças. É um jogo que, como diz a capa, foi “feito para super jogadores”: gente que tinha debulhado completamente o primeiro jogo e ia precisar de um desafio muito maior para se satisfazer. Era um jogo mais longo e mais difícil, porém, essas adições nem sempre eram ao seu favor, já que o ritmo não era tão conciso quanto o do original, você tinha que tentar várias vezes o mesmo desafio, e às vezes ele exigia uma precisão tão grande que podia se tornar irritante ou simplesmente injusto. Ainda um jogo muito bom, mas mal balanceado, e inferior ao seu antecessor.

…Yup. Mesma coisa aqui.

Pra quem não conhece (sério?), Hotline Miami é um jogo indie de 2012 que foi ganhando bastante falatório e popularidade através do boca-a-boca, mais ou menos como Demon’s Souls fez nos consoles grandes. O jogo contava a história de um personagem sem nome (o qual ficou conhecido como “Jacket” pelos fãs, devido à jaqueta que usava) que recebia ligações misteriosas que o mandava realizar certos trabalhos. Com um estilo bem característico (fortemente inspirado no filme Drive de Nicolas Winding Refn), trilha sonora marcante e uma ação frenética, o jogo caiu – merecidamente – nas graças da comunidade.

Dois anos e alguns meses depois, temos a sua sequência, Hotline Miami 2: Wrong Number. No estilo esperado de uma sequência, é um jogo maior, mais longo, e com mais ideias, porém, com mais falhas. Por mais que o “grosso” do jogo permaneça o mesmo, algumas decisões de design no mínimo questionáveis o impedem de ser tão divertido quanto ele um dia já foi.

Os problemas principais de Hotline Miami 2 são dois. Primeiro: os cenários são enormes. O primeiro jogo se continha em salas pequenas e andares, o que permitia o seu ritmo frenético. Os cenários de Hotline 2 são grandes demais, e com armadilhas demais. Você vai morrer várias vezes por causa de um inimigo que não estava ali, uma bala que veio sabe-se lá de onde ou uma janela propositalmente sacana. O tamanho absurdo torna bastante complicado manter vigília nos seus arredores, e mesmo usando o Shift para ver mais longe (algo que, assim como a trava de mira, era praticamente opcional no primeiro mas se tornou obrigatório no segundo) você ainda vai morrer muito por simplesmente não saber que tinha algo ali. Isso acaba tornando a experiência injusta e frustrante.

O segundo é que, assim como Super Mario Bros 2, você tem muito menos chance de fazer “freestyle” aqui. Lutas com armas de fogo são praticamente obrigatórias em certos casos ao invés de te dar a liberdade de abordar como quiser. Os cenários amplos te tão a impressão de vários caminhos, mas se você não seguir um bem específico, com uma coreografia ensaiada, provavelmente não vai sobreviver. Muitas das estratégias que no original eram opcionais se tornaram quase mandatórias aqui, diminuindo bastante a liberdade.

Tem uma fase lá pra metade que é um exemplo perfeito disso: ela te manda um grandão invulnerável a ataques corpo a corpo antes mesmo de você ter acesso a uma arma de fogo. Você precisa, obrigatoriamente, matar ou derrubar o único inimigo no andar que tem um rifle para matá-lo. Pra ficar ainda mais complicado, tanto o grandão quanto o cara com um rifle estão COLADOS e tem o mesmo padrão de movimento. Erre por milisegundos e você já era. O segundo andar dessa fase é tão “siga à risca ou morre” quanto o primeiro. Fases posteriores são ainda piores, com grandões e “ninjas” (inimigos invulneráveis a balas) aparecendo nos piores momentos possíveis.

Das duas, uma: ou essa mudança foi completamente proposital pelos desenvolvedores, ou isso é um resultado de se ter passado tanto tempo imerso no desenvolvimento de um jogo a ponto de não saber mais dosar bem a dificuldade e equilíbrio de algo. Por meio a tantos testes, tanto faz e refaz, e no empenho de agradar aos fãs do original, o jogo foi feito especificamente para fãs do original (inclusive, se você não jogou o 1, por favor, nem pense em começar por aqui!).

O problema é que quando você exige tanta perfeição do jogador, acaba restringindo sua liberdade e fazendo tudo começar a parecer “trabalho”. Algumas fases chegam a durar trinta, quarenta minutos ou mais, e os andares gigantes tornam os checkpoints esparsos e certos momentos frustrantes.

Uma das coisas mais legais do original eram aqueles momentos onde todo um caos acontecia mas no fim tudo dava certo, ou então ver outra pessoa jogar e reconhecer um estilo bastante diferente. Isso não vai acontecer tanto aqui no 2: existe um caminho pré-determinado que todo mundo vai mais ou menos seguir se quiser sobreviver, e ainda assim, vai repetir muuuito até conseguir terminar. Até a variedade de armas que você pode usar parece menor. O intuito de dar personagens e fases diferentes foi uma tentativa de tornar o jogo variado, mas não funcionou como devia já que acabou limitando a experiência do jogador. (Em tempo: jogar com os Fãs é bastante divertido, principalmente quando você pode escolher suas máscaras e em ambientes fechados. Eu francamente ia gostar se o jogo inteiro tivesse seguido esse estilo. Sorte que o Editor de Fases tá vindo aí no futuro – algo que eu vejo aumentando a longevidade do título por muito, muito tempo.)

Focar tanto nos defeitos dá a impressão de que o jogo não seja tão bom assim, o que não seria verdade. Hotline Miami 2 ainda é um jogo MUITO divertido, certos personagens são bem legais de controlar (Ash e Alex são meus favoritos), a trilha sonora é sensacional, a história continua sendo aquela coisa propositalmente críptica (narrada através de fitas VHS que passam de forma anacrônica, pra que o jogador precise investigar para fazer qualquer sentido delas) e algumas fases – como a da fuga da prisão, talvez a melhor da série – são espetaculares. É uma pena que para cada fase excelente existe uma fase irritante no meio, tais como as frustrantes missões do Soldier. E em tempo: levei aproximadamente 7 horas para terminar a campanha principal, e ouvi de gente que levou de 6 a 11 horas pra fazer o mesmo. O jogo é mais longo, o que pode ser bom ou ruim dependendo da sua concepção (sei que vou pular certas fases quando for rejogar) e tem um modo Hard que eu não tenho certeza se foi devidamente testado.

Mesmo com seus pesares e não superando o original, Hotline Miami 2: Wrong Number ainda é um ótimo jogo. Para quem esperava mais do mesmo (o que, francamente, acho que todo fã esperava) e tem paciência pra aguentar o esquema tentativa-e-erro bem mais pesado, vale a pena. Só se prepare para uma jornada muito, muito difícil.

Hotline Miami 2 é maior e mais robusto, mas talvez seja o argumento perfeito de que em time que está ganhando não se mexe. No fim, quando pensarmos em Hotline Miami, nós ainda vamos nos lembrar do primeiro: amador, compacto, despretensioso, icônico, clássico e inesquecível.

Hotline Miami 2 está disponível para PS4, PSVita e PC (Steam). Essa análise foi feita com base na versão de Steam entregue a nós pela Devolver Digital.

Sobre

Rodrigo "Rod" é de Salvador, Bahia. Estuda psicologia mas finge ser comunicador. Acha que entende alguma coisa sobre design de games.
  • c0mila

    Acho que esse texto me deu uma vontadezinha de tirar o jogo da Wishlist…

    • Rod

      Se você é fã do original, eu diria não pra remover, mas talvez esperar algum desconto na próxima sale. Apesar dele ter alguns aspectos verdadeiramente frustrantes, eu ainda achei um jogo bem, bem divertido – e minha opinião sobre o jogo foi certamente melhorando à medida que passei mais tempo com ele. Não é tão fluido quanto o anterior, o que me obrigou a ser mais crítico, mas não me arrependi de tê-lo jogado.

  • Mateus Alexandre

    Maravilhosa análise. Expressou EXATAMENTE o que eu sinto sobre essa sequência.

    Só pra desabafar: teve uma fase dos Soldiers (jogando com o Beard mais jovem) que eu levei 55 minutos pra completar. Quase estraguei meu teclado babando de raiva em cima dele.

  • Alberg

    Ficava olhando os gameplays e realmente ficava me parecendo que tinha um foco maior nas armas de fogo, eu sempre jogava com a máscara que matava com socos (tigre?), meio desapontado, mas não duvido que seja bom no final das contas

  • João P. B. Paraizo

    Excelente análise, Rod e acho que isso dos cenários foi proposital.

    Isso de quebrar um pouco o “freestyle” do primeiro jogo não me incomodou muito. Sendo sincero, nem reparei tanto. Apesar de ter ficado preso por muito tempo em certas fases, eu sempre encontrava, às vezes de um jeito meio estranho, formas de terminá-la sem precisar seguir uma linha mais óbvia.

    Acho que isso de dar um enfoque maior às armas de fogo talvez dê essa impressão, não sei. Com certas armas você pode simplesmente cagar para o padrão e esperar no canto, tendo que se virar um pouco quando aparece um dos gordões e tal. Mas aí depende do seu tipo de jogo.

    Algumas missões meio que te obrigam a seguir uma linha, mas encaro de uma forma mais lúdica.

    Cada personagem ali é uma personalidade, so, cada um tem seu estilo. As missões com os Fans, aonde um deles possui apenas suas mãos como armas, não te vetam (ao menos eu não me senti vetado). Talvez seja uma dificuldade a mais e tal, mas, como disse: depende do seu tipo de jogo. Elas te dão a possibilidade de cagar regra e te dão a possibilidade de ser sutil e acho que essas duas linhas já são suficientes para estimular sua criatividade com os quatro.

    As missões com o Pardo se encaixam bem com minha visão: ele é impulsivo e agressivo. A primeira missão dele é tu entrando em uma loja de mãos vazias e ele não dá instant kill com seus socos (!). O melhor de tudo é que logo no primeiro andar, tem vários capangas com armas de fogo ou seja: esse cara é maluco e isso fica claro conforme a história passa. Todas as entradas dele são meio “atira primeiro e pergunta depois” e acho que cada fase expressa bem a personalidade de cada.

    E acho que de fato a intenção é lembrarmos do primeiro, ou dos dois como um só. Talvez o paralelo com o lost levels tenha até muito sentido. É muito desconexo e sem sentido jogar o segundo sem ter o primeiro como base. Principalmente pensando da forma que analiso os dois jogos, não há sentido isolar o segundo. O segundo é para ser uma grande conclusão e a piada final do jogo (mostrando uma tela de um suposto Hotline Miami 3 e logo em seguida voltando pro menu inicial do 2) deixa isso bem claro.

  • http://www.iltonalberto.com.br/ Ilton Alberto Junior

    Eu concordo e discordo ao mesmo tempo. Achei Hotline Miami 2 sensacional.

    Eu não esperava nada além de uma sequência direta. Não estava esperando inovações na jogabilidade e me surpreendi com a nova variedade de personagens e habilidades. Os Fans são o clássico já conhecido do primeiro. Ai temos o Pardo, com o melhor storytelling de todos e o Evan, com uma das melhores sacadas em jogabilidade ever.

    Claro, temos partes frustrantes. As cenas com o Soldier são bem chatinhas e o The Son tem umas fases colossais, mas não me incomodou. Acho que o que mais me prende é que ele é um jogo difícil, que me faz ficar horas e horas, apertando o Restart, mas não a ponto de me frustrar. Cada tentativa me motiva mais.

    Ok que mudou o ritmo um pouco. No primeiro, eu preferia resolver as coisas usando armas brancas e com arremessos, nesse eu tive que aprender a usar armas de fogo e a me controlar com as “rajadas” das metralhadoras. Um tiro preciso é mais eficiente que uma rajada.

    De fato gostei muito desse jogo. Não tem a mente fodida e insana do Jacket, mas tem vários momentos marcantes. Detalhes para a cena da fuga da prisão e da bad trip final. Pra mim, um dos melhores jogos do ano.

  • Eduardo Machado

    Baita análise, ilustrou o que eu tava sentindo sobre o jogo mas nem sabia expressar direito, no fim, acho que curti bem mais o ambiente propício a um gameplay mais emergente do primeiro título. Vou deixar esse vídeo aqui para fins de: a zoeira nunca acaba – e a insanidade do hotline também não.
    https://www.youtube.com/watch?v=y7MPBaa-h_M

  • http://twitter.com/_mindkiller Rafael-DFL

    Hotline Miami 2 é, literalmente, duas vezes o primeiro Hotline Miami. São mais fases, muito mais músicas (e puta que pariu, que musicas), uma história mais ambiciosa e contada de forma maior e mais esparsa. Hotline Miami 2 é muito mais ambicioso e grandioso que seu antecessor e sinceramente…isso não é necessariamente boa coisa.

    O que me incomodou num geral foi justamente a mecânica de diversos personagens e a limitação dos mesmos em cada fase. Todos eles são controlados da mesma maneira, mas cada um possui sua particularidade, o que é interessante. A mudança constante de personagens te obriga experimentar diferentes modos de jogar a cada fase, o que é bom por um lado. Acontece que dessa vez, diferente do primeiro Hotline Miami, cada fase geralmente está atrelada apenas à um personagem com um estilo de gameplay (tirando uma ou outra fase de alguns personagens, como os fãs).

    O fato de não poder utilizar diferentes habilidades em maioria das fases, acaba limitando demais a abordagem das mesmas: elas deixaram de ser um “playground” em que você podia explorá-las da forma como achava mais conveniente, como era no primeiro Hotline Miami, pra se tornar algo mais metódico. Enquanto no primeiro jogo eu explorava as possibilidades de terminar uma fase freneticamente ou de modo “stealth”, no HLM2, minha estratégia é basicamente chamar a atenção do inimigo, me esconder atrás de um objeto e atacar o inimigo quando ele estiver próximo. Não signfica que o HLM2 condicione o jogador a uma maneira restrita de se jogar cada fase, mas parece que as opções são muito mais escassas que o primeiro, ainda mais porque a tensão de errar, devido a dificuldade e o tamanho das fases, é ainda maior

    O que leva a outra coisa me incomodou também, como o Rod citou: a forma como o jogo é construído, repleto de fases grandes demais e lotadas de inimigos que parecem mal posicionados. Nesse caso, Hotline Miami 2 deixa de ser um jogo difícil em certos locais e passa a ser injusto, tamanha a precisão que ele requer do jogador. A 11º fase no modo Hard é praticamente um inferno de se passar por conta do tanto de inimigo gordo e janelas em uma parte específica, fora o fato da fase ter 5 telas diferentes. O que no primeiro jogo eram pequenas “doses de adrenalina” em cada fase, se tornaram doses cavalares no HLM2 por conta do tamanho das fases e de certas decisões de design, o que acaba cansando ao longo do tempo. Isso influencia bastante nas suas escolhas e na sua liberdade de jogar. No final das contas você acaba dependendo demais das armas de fogo e explora muito pouco a pouca variedade de armas brancas que estão à disposição.

    Num geral, ainda achei o Hotline Miami 2 um ótimo jogo com uma puta trilha sonora, mas jogando pela segunda vez, e no Modo hard, eu fico pensando como essas escolhas de design e essa vontade de ser um jogo maior acabaram afetando negativamente um gameplay que era mais sólido e objetivo no primeiro título. De qualquer forma, a última fase e a forma como o jogo se conclui ao juntar os diferentes pontos de vista é sensacional.

    Belo review, Rod!

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