Se você está lendo isso, provavelmente já conhece Hotline Miami. Talvez a sua dúvida seja saber que tipo de sequência Hotline Miami 2: Wrong Number é. Será que é uma sequência tipo Uncharted 2, que melhora basicamente tudo do original? Será que é tipo Jak 2, que perde a alma e estraga tudo que o original tinha de bom? Ou será que é tipo Super Mario Galaxy 2, que é tecnicamente mais do mesmo, só que ainda melhor?
Nenhum desses. Hotline Miami 2 é uma sequência no estilo de Super Mario Bros 2. Sim, a versão japonesa. O nosso “Lost Levels”.
Antes que você me xingue, deixa eu explicar: Super Mario Bros 2 é o tipo de jogo que parece mais uma expansão do que uma sequência, mantendo a mesma estrutura do original sem grandes mudanças. É um jogo que, como diz a capa, foi “feito para super jogadores”: gente que tinha debulhado completamente o primeiro jogo e ia precisar de um desafio muito maior para se satisfazer. Era um jogo mais longo e mais difícil, porém, essas adições nem sempre eram ao seu favor, já que o ritmo não era tão conciso quanto o do original, você tinha que tentar várias vezes o mesmo desafio, e às vezes ele exigia uma precisão tão grande que podia se tornar irritante ou simplesmente injusto. Ainda um jogo muito bom, mas mal balanceado, e inferior ao seu antecessor.
…Yup. Mesma coisa aqui.
Pra quem não conhece (sério?), Hotline Miami é um jogo indie de 2012 que foi ganhando bastante falatório e popularidade através do boca-a-boca, mais ou menos como Demon’s Souls fez nos consoles grandes. O jogo contava a história de um personagem sem nome (o qual ficou conhecido como “Jacket” pelos fãs, devido à jaqueta que usava) que recebia ligações misteriosas que o mandava realizar certos trabalhos. Com um estilo bem característico (fortemente inspirado no filme Drive de Nicolas Winding Refn), trilha sonora marcante e uma ação frenética, o jogo caiu – merecidamente – nas graças da comunidade.
Dois anos e alguns meses depois, temos a sua sequência, Hotline Miami 2: Wrong Number. No estilo esperado de uma sequência, é um jogo maior, mais longo, e com mais ideias, porém, com mais falhas. Por mais que o “grosso” do jogo permaneça o mesmo, algumas decisões de design no mínimo questionáveis o impedem de ser tão divertido quanto ele um dia já foi.
Os problemas principais de Hotline Miami 2 são dois. Primeiro: os cenários são enormes. O primeiro jogo se continha em salas pequenas e andares, o que permitia o seu ritmo frenético. Os cenários de Hotline 2 são grandes demais, e com armadilhas demais. Você vai morrer várias vezes por causa de um inimigo que não estava ali, uma bala que veio sabe-se lá de onde ou uma janela propositalmente sacana. O tamanho absurdo torna bastante complicado manter vigília nos seus arredores, e mesmo usando o Shift para ver mais longe (algo que, assim como a trava de mira, era praticamente opcional no primeiro mas se tornou obrigatório no segundo) você ainda vai morrer muito por simplesmente não saber que tinha algo ali. Isso acaba tornando a experiência injusta e frustrante.
O segundo é que, assim como Super Mario Bros 2, você tem muito menos chance de fazer “freestyle” aqui. Lutas com armas de fogo são praticamente obrigatórias em certos casos ao invés de te dar a liberdade de abordar como quiser. Os cenários amplos te tão a impressão de vários caminhos, mas se você não seguir um bem específico, com uma coreografia ensaiada, provavelmente não vai sobreviver. Muitas das estratégias que no original eram opcionais se tornaram quase mandatórias aqui, diminuindo bastante a liberdade.
Tem uma fase lá pra metade que é um exemplo perfeito disso: ela te manda um grandão invulnerável a ataques corpo a corpo antes mesmo de você ter acesso a uma arma de fogo. Você precisa, obrigatoriamente, matar ou derrubar o único inimigo no andar que tem um rifle para matá-lo. Pra ficar ainda mais complicado, tanto o grandão quanto o cara com um rifle estão COLADOS e tem o mesmo padrão de movimento. Erre por milisegundos e você já era. O segundo andar dessa fase é tão “siga à risca ou morre” quanto o primeiro. Fases posteriores são ainda piores, com grandões e “ninjas” (inimigos invulneráveis a balas) aparecendo nos piores momentos possíveis.
Das duas, uma: ou essa mudança foi completamente proposital pelos desenvolvedores, ou isso é um resultado de se ter passado tanto tempo imerso no desenvolvimento de um jogo a ponto de não saber mais dosar bem a dificuldade e equilíbrio de algo. Por meio a tantos testes, tanto faz e refaz, e no empenho de agradar aos fãs do original, o jogo foi feito especificamente para fãs do original (inclusive, se você não jogou o 1, por favor, nem pense em começar por aqui!).
O problema é que quando você exige tanta perfeição do jogador, acaba restringindo sua liberdade e fazendo tudo começar a parecer “trabalho”. Algumas fases chegam a durar trinta, quarenta minutos ou mais, e os andares gigantes tornam os checkpoints esparsos e certos momentos frustrantes.
Uma das coisas mais legais do original eram aqueles momentos onde todo um caos acontecia mas no fim tudo dava certo, ou então ver outra pessoa jogar e reconhecer um estilo bastante diferente. Isso não vai acontecer tanto aqui no 2: existe um caminho pré-determinado que todo mundo vai mais ou menos seguir se quiser sobreviver, e ainda assim, vai repetir muuuito até conseguir terminar. Até a variedade de armas que você pode usar parece menor. O intuito de dar personagens e fases diferentes foi uma tentativa de tornar o jogo variado, mas não funcionou como devia já que acabou limitando a experiência do jogador. (Em tempo: jogar com os Fãs é bastante divertido, principalmente quando você pode escolher suas máscaras e em ambientes fechados. Eu francamente ia gostar se o jogo inteiro tivesse seguido esse estilo. Sorte que o Editor de Fases tá vindo aí no futuro – algo que eu vejo aumentando a longevidade do título por muito, muito tempo.)
Focar tanto nos defeitos dá a impressão de que o jogo não seja tão bom assim, o que não seria verdade. Hotline Miami 2 ainda é um jogo MUITO divertido, certos personagens são bem legais de controlar (Ash e Alex são meus favoritos), a trilha sonora é sensacional, a história continua sendo aquela coisa propositalmente críptica (narrada através de fitas VHS que passam de forma anacrônica, pra que o jogador precise investigar para fazer qualquer sentido delas) e algumas fases – como a da fuga da prisão, talvez a melhor da série – são espetaculares. É uma pena que para cada fase excelente existe uma fase irritante no meio, tais como as frustrantes missões do Soldier. E em tempo: levei aproximadamente 7 horas para terminar a campanha principal, e ouvi de gente que levou de 6 a 11 horas pra fazer o mesmo. O jogo é mais longo, o que pode ser bom ou ruim dependendo da sua concepção (sei que vou pular certas fases quando for rejogar) e tem um modo Hard que eu não tenho certeza se foi devidamente testado.
Mesmo com seus pesares e não superando o original, Hotline Miami 2: Wrong Number ainda é um ótimo jogo. Para quem esperava mais do mesmo (o que, francamente, acho que todo fã esperava) e tem paciência pra aguentar o esquema tentativa-e-erro bem mais pesado, vale a pena. Só se prepare para uma jornada muito, muito difícil.
Hotline Miami 2 é maior e mais robusto, mas talvez seja o argumento perfeito de que em time que está ganhando não se mexe. No fim, quando pensarmos em Hotline Miami, nós ainda vamos nos lembrar do primeiro: amador, compacto, despretensioso, icônico, clássico e inesquecível.
Hotline Miami 2 está disponível para PS4, PSVita e PC (Steam). Essa análise foi feita com base na versão de Steam entregue a nós pela Devolver Digital.