Kualé a desse tal de… Mortal Kombat X

Indo contra as recomendações da ESRB, do Ministério da Justiça e do Marcelo Rezende, eu devia ter uns 9 anos na primeira vez que joguei Mortal Kombat. Na época eu era um pimpolho com os dedos cheios de bolhas por passar muito tempo jogando Street Fighter II Turbo no meu Mega Drive (novamente ignorando o Ministério da Justiça, mas era legal pra caralho), e um dia um amigo meu apareceu com uma fita de Mortal Kombat lá em casa. Nós colocamos ela no Mega Drive, ligamos o console e uma das primeiras reações que eu tive foi “bacana, tem ninjas!”.  Passadas algumas lutas eu percebi que ele era legalzinho mas eu ainda preferia Street Fighter. Neste momento, meu amigo apertou uma sequência complexa de botões no controle e de repente o Kano estava arrancando o coração do Sub-Zero com as mãos, dando uma mordida e exibindo-o pulsante como um troféu enquanto o sangue pingava de um modo muito tosco.

“CARALHOOCARAARRANCOUOCARAÇÃODOCARAPUTAQUEPARIU” ou alguma coisa bem próxima disso foi a minha reação. E a partir daí passei a preferir Mortal Kombat.

Hoje vejo valor nas duas séries. Acho que gosto um pouco mais de Street Fighter, mas Mortal Kombat ainda tem esse lugar especial e sangrento no meu coração. Foram vários e vários finais de semana jogando e, em um certo ponto da minha adolescência, eu sabia de cabeça a combinação de qualquer fatality, babality, animality e coisality de Mortal Kombat II e/ou III, eu realmente gostava daqueles jogos.

Mortal Kombat surgiu numa época em que os jogos de luta eram como são os MOBAs de hoje: toda semana saía um novo, mas todo mundo só jogava dois (tirando aquele seu amigo diferentão que jogava Eternal Champions), e todos eles imitavam Street Fighter de algum modo. Mortal Kombat ia contra essa corrente. Além da violência exagerada (que, pra falar a verdade, não era tão incomum assim na época), havia uma filosofia bem diferente do resto. Enquanto o Ryu grita “HADOUKEN” pra sinalizar que vai soltar uma bola de fogo azul, o Scorpion grita “GET OVER HERE” de modo irônico, zombando do oponente enquanto puxa ele pra perto com uma corrente. Mortal Kombat não quer que você seja o Bruce Lee lutando de forma honorável e honrando seus oponentes, Mortal Kombat quer que você se sinta como o Van Damme dizendo uma frase de efeito enquanto chuta um bandido na cara.

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Os personagens tinham todos a mesma altura (provavelmente pros fatalities não bugarem) e tinham todos os mesmos movimentos básicos. O diferencial estava nos especiais, logo estes tinham que ser, bom, realmente especiais. Uns teletransportavam, outros congelavam o inimigo, outros traziam ele mais pra perto. Eu diria que eles eram mais “práticos” que os da concorrência; talvez, por esta importância maior, os comandos para executar estes golpes também fossem mais simples. Além disso, os comandos básicos também eram diferentes dos outros jogos de luta: 2 botões de chute, 2 de soco e um botão de bloqueio. Estava criada uma escola de jogos de luta nova.

Essa escola foi se aprimorando com personagens novos, especiais mais especiais e um eventual sistema de combos. Como era inevitável na segunda metade da década de 90, a série foi pro 3D e continuou evoluindo com novos elementos: variações de personagens, armas, cenários que te matam, um Liu Kang zumbi, um jogo de Wii com especiais executados chacoalhando o controle, crossovers com a DC, etc. Mortal Kombat continuou experimentando, até que chegou num ponto em que mal dava pra reconhecer o jogo. Foi aí que perceberam que o melhor a fazer era começar tudo de novo.

O jogo de 2011 é popularmente conhecido como Mortal Kombat 9 pra evitar maiores confusões mas a verdade é que ele merece o nome oficial de “Mortal Kombat”, sem número ou subtítulo algum. O jogo tirava todas as firulas implementadas ao longo dos anos e voltava à base da escola MK, lá pra quando a série ainda era feita com fotos se mexendo, porém  adaptada pros dias de hoje, com lutas mais rápidas, golpes menos travados e personagens reimaginados.

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Uma novidade foi o tal do “X-Ray move”, basicamente um fatality que não mata. Um combo especial fácil de aplicar que tira boa parte da vida mas que ao mesmo tempo tem aquele mesmo efeito do fatality de CARALHOOCARAQUEBRÔOSOSSODOTROTODOPUTAQUEPARIU, afinal Mortal Kombat ainda quer que você se sinta o Van Damme.

Mas o Mortal Kombat de 2011 era um jogo bem seguro. Entrando na onda de Street Fighter IV e outros revivals da geração passada, tudo o que ele queria era agradar quem jogou os jogos em 199X e fazê-los se sentirem como se estivessem jogando aquilo de novo, só que com gráficos e controles modernos. Era praticamente um remake da trilogia original apenas com personagens dos jogos mais memoráveis (os 3 primeiros), sem nenhuma novidade (tirando os DLCs e o Kratos exclusivo do PS3). Até os cenários eram os mesmos.

A adição menos segura do jogo, o modo história, que bravamente tentava colocar alguma narrativa em um jogo de luta, só recontava o que havia acontecido nos três primeiros jogos da série e servia bem como um grande fanservice e talvez um tutorial, mas não muito mais do que isso.

Mas Mortal Kombat X né? É pra isso que você está aqui, acho.

Mantendo a numeração confusa, o novo jogo pega a última versão da Escola Mortal Kombat de jogos de luta deixada pelo último jogo e evolui em cima dela, como se o ciclo tivesse recomeçado, como se o X valesse 2. Logo, tudo que eu falei lá no inicio sobre a filosofia da série continua valendo aqui e o que diferencia esse do título anterior é que a NetherRealm resolver soltar as asinhas e começar a se arriscar um pouco mais.

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Mortal Kombat X traz vários personagens novos. Não dá mais pra dizer que os personagens agora são todos iguais porque apesar do maior diferencial deles ainda estar nos especiais, você tem coisas bem diferentes como a mulher abelha e o cara grandão com uma criança psicopata montada em cima. Mesmo os personagens velhos sofreram modificações e todos agora tem 3 variações para se escolher, o que não necessariamente triplica o número de personagens, já que algumas variações não mudam tanto assim, a não ser que você jogue Mortal Kombat em nível profissional e se empenhe em estudar as diferenças entre cada uma. Quem joga só pra curtir umas decapitações vai ficar feliz em saber que todas as variações do Scorpion tem o getoverhere e todas as do Sub-Zero tem a rasteirinha.

Kualé a desse tal de... Mortal Kombat X (bonus: e um pouco sobre o resto da série também)

Não mais limitado em ter que recontar os 3 jogos da série, o modo história agora tenta realmente contar alguma coisa e conseguiria até se passar por um filminho bacana na Sessão da Tarde se removessem as lutas. A ideia ainda é mais ou menos a mesma do modo história de Call of Duty, fazer você entender o básico do jogo enquanto curte uma historinha pra depois você usar o que aprendeu no multiplayer. Mas ela não é só um monte de pretextos pra lutas como era no jogo anterior; às vezes dá até pra sentir uma evolução nos personagens.

Os Fatalities e X-rays também estão bem mais criativos, como costumavam ser antigamente. Não bastava o Kano arrancar o coração do pobre coitado, ele tinha que morder e deixar ele pingando. Não basta a Cassie Cage quebrar a mandíbula do outro lutador, ela tem que tirar uma selfie e postar no Facebook. É nojento e grosseiro mas ao mesmo tempo tão cruel e sem noção que eu só consigo me sentir como um adolescente de novo achando aquilo tudo muito legal. Porque esse é o papel da violência em Mortal Kombat X, não é pra chocar nem pra deixar ninguém enojado, é pra fazer um moleque de 15 anos se maravilhar contando pros amigos que CARALHOOSUBZEROARRANCOASTRIPADOCARACONGELOEENFIONACARADELEPUTAQUEPARIU! E o jogo novo faz isso melhor do que nunca.

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E sim, o jogo deixa você comprar itens e fatalities mais fáceis com dinheiro de verdade, mas ele também deixa você abrir essas coisas com dinheiro do próprio jogo e não faltam lugares pra você ganhar esse dinheiro: não só você ganha isso em qualquer luta, mas todos os dias o jogo traz novos desafios online pra você ter sempre o que fazer e não precisar só ficar nas mesmas lutas repetitivas. Recentemente o Jason foi incluído no jogo via DLC e um dos desafios era jogar com ele pra vencer uma série de personagens (sem precisar comprá-lo).

Mas o importante é que Mortal Kombat X prova que o jogo anterior não foi um ponto fora da curva. A série está de volta, mais divertida, mais criativa, com uma história mais bem escrita e menos recomendada pelo Ministério da Justiça do que nunca!

Mortal Kombat X está disponível para PS4, XONE e PC. Esta análise foi feita a partir de uma cópia de review da versão PC, nos cedida pela Warner Brasil.

Tuba

Sobre

Arthur “Tuba” Zeferino é co-criador do site, programador e brother indie.
  • Victor Hugo Dalalibera

    Eu acho que sou o único até hoje que se negou a aprender os fatalities e continua apertando descontroladamente todos os botões no aguardo de algo sair

  • Guilherme

    Gostei dessa análise. Me senti como quando joguei o Mortal Kombat 3 á muito tempo atrás.

  • http://www.cupulablogs.com/madmaxandrade Tiago Andrade

    Pelo pouco que vi de MKX, ele confirma a impressão que MK9 passou: a Netherrealm finalmente tem dinheiro e tecnologia para fazer MK como sempre quis. No mais, mais uma assaz excelente resenha – com direito à comparação certeira entre a cena de jogos de luta dos anos 90 e a dos MOBAs na atualidade.

  • Take it easy, Blue

    Engraçado que lia isso no trabalho e meu supervisor teve a reação de “CARALHOOSUBZEROARRANCOASTRIPADOCARACONGELOEENFIONACARADELEPUTAQUEPARIU” quando passou por mim e viu o gif do final do post

  • http://www.zelda.com.br/ Twero

    “Mas Mortal Kombat X né? É pra isso que você está aqui, acho.”
    Não, eu vim aqui ver as reações do Tubinha ao ver um fatality no MK (sério, foram as melhores partes).

    No mais, ótimo review que, além de fazer um levantamento do que a série é, foi bem direto ao ponto, ao invés de ficar falando da dublagem de um único personagem opcional.

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