Final Fantasy IX no PC: sobre a ausência de um “Disco 1” para nos guiar

  19/04/2016 - 14:59   nostalgia,  
 

Apenas um devaneio aqui. Eu estou rejogando Final Fantasy IX na nova versão feita para PC, alguns bons, bons anos após ter jogado a versão original na retrocompatibilidade do meu PS2. E é curioso como uma das fontes de divisão de informação mais utilizadas na época hoje é algo basicamente inexistente, e não serve para qualquer tipo de referência: a divisão em discos.

Pra você que começou a jogar na era PS2 e talvez seja novo demais para lembrar, grande parte dos jogos de PS1 e Saturn eram divididos em múltiplos discos, os quais eram trocados de acordo com a progressão ou o modo de jogo que você desejava jogar. Em geral quase todo esse espaço era comido pelos arquivos de vídeo (as gloriosas CGs, mais populares em RPGs de alto orçamento), que utilizavam codecs ultrapassados e, apesar da bitrate baixa, acabavam comendo um espaço impressionante.

A maior parte dos jogos que usava múltiplos CDs eram os RPGs, mas havia algumas exceções particulares em determinados campos: Resident Evil 2 e Metal Gear Solid eram jogos de ação que contavam com 2 CDs cada, o primeiro contendo um cenário de cada personagem em cada CD, o segundo contendo a inteiridade da campanha (que, por ser completamente dublada e ter várias conversas de codec, ocupava bastante espaço também – apesar da maioria das cutscenes serem feitas com modelos in-game). Fear Effect, que utilizava FMVs para os cenários, pedia pra você alternar os discos de acordo com o cenário. Gran Turismo 2 tinha um disco para o modo Simulação e outro para modo Arcade. A maioria dos exemplos que lembramos é do PS1, mas o Saturn também tinha seus jogos de múltiplos discos: o mais notório dele sendo o épico Panzer Dragoon Saga, que não poupava esforços em ser essencialmente um anime em forma de jogo (na época que anime era bom!).

Isso é uma aula bonitinha de nostalgia e de história, mas afinal por que diabos eu estou falando disso tão repentinamente? É simplesmente por perceber que, ao se ter um relançamento digital de um jogo que era originalmente segmentado em várias partes, você tem uma enorme descontrução do que antes era um centro de informações bem-definido. Durante 16 anos, o único lar de Final Fantasy IX foi o PS1. O fato dessa nova versão não precisar se dividir em partes determinadas é incrivelmente cômodo, mas também causa uma pequena confusão e dificuldade situacionais que eu nunca imaginei que fosse sentir falta.

Considere por nostalgia, mesmo: lembra da época que algum amigo seu te dizia que chegou no Disco 3 de Final Fantasy VII, mas não terminou? Ou quando você pegava o Disco 1 emprestado de um RPG com um amigo seu e terminava mas não podia continuar a jornada pois ele ainda estava jogando o Disco 2? Lembra a dissonância que as pessoas costumam associar ao Disco 2 de Xenogears, em contrapartida ao 1? O quanto parecia que o pacing, o progresso, as prioridades e até o orçamento de determinadas partes pareciam atreladas a um Disco específico?

Se você já tivesse jogado o game anteriormente, saberia que havia passado um “checkpoint” considerável, que havia chegado em uma parte significativa da história. Era uma sensação curiosa, mas também recompensadora. Você sentia que havia feito progresso, você sabia de onde continuar caso parasse por muito tempo, você conseguia se situar; arrisco até dizer que certas situações ficavam melhor guardadas na sua memória sempre que você sabia que tal cena precedia ou sucedia uma troca de discos. Sempre que havia uma cena grandiosa, fodona, cheia de CGs, era comum você ter uma troca de discos logo em seguida. Quem não lembra de ter que trocar os discos após uma luta espetacular contra o Atolm Dragon em Panzer Dragoon Saga? (eu sei, um monte de gente não lembra. Vão jogar Panzer Dragoon Saga, seus monstros!)

Ne-Rai!

Isso aqui nada mais é que uma pequena viagem no tempo onde eu me permito sentir saudade de algo que originalmente seria relativamente incômodo, mas que teve seu momento bem definido no tempo e foi uma alternativa válida para que os jogos permitissem uma expansão muito além dos limites da época. É uma daquelas coisas que eu acredito faz a gente entender um pouquinho mais de game design, ou ao menos parar pra pensar como são feitos os jogos que a gente joga e ama, ao passo de que conseguimos segmentá-los, seja mentalmente, seja fisicamente, seja de forma catalogal (sério, vá procurar qualquer informação sobre FFIX hoje. TODAS ELAS fazem referência a um disco ou coisa assim, algo que não faz o mínimo sentido pra quem for jogar pela primeira vez – mas fazia todo o sentido pra quem já tinha jogado!). Eu acredito que a informação coletiva armazenada sobre um jogo é tão importante quanto o próprio jogo, então é interessante parar pra pensar um pouquinho sobre isso.

Se bem que… bom, talvez não estejamos tão distantes assim de ver isso tudo acontecer de novo, já que a indústria também criou um modelo equivalente para ser utilizado na era de distribuição digital. O remake de Final Fantasy VII vai ser dividido em capítulos, né? Então quem sabe a gente vai voltar a dizer que “parou no final do Disco 1” mais uma vez, em um breve futuro. Como quer que seja, vai ser divertido; e vai dar pra matar a saudade da época que as coisas eram um pouquinho mais mastigadinhas, também.

Sobre

Rodrigo "Rod" é de Salvador, Bahia. Estuda psicologia, finge ser escritor, e acha que entende alguma coisa sobre game design.

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