NEW AGE RETRO GAMER #33: A morbidez hipnótica de Hotline Miami

  27/06/2013 - 20:21   Hotline Miami, NARG,  
 

NARG #33
Hotline Miami
Dennaton Games / Devolver Digital
2012

Eu vivo dizendo que eu poderia fazer um fuckin’ ensaio sobre Hotline Miami. Falar que ele é um dos jogos mais importantes dos últimos anos não é um exagero.

Ele era um jogo indie, lançado por uma publisher pequena, e naturalmente, você não ia ter milhões e milhões de dólares sendo jogados contra o ventilador com marketing, como acontece nas grandes companhias. Foi com o burburinho na comunidade, a atitude inusitada do próprio criador ao upar ELE MESMO um torrent da versão patchada de seu jogo pros piratas e outras coisas tipo esse lindo 10 da Eurogamer que fizeram as pessoas olharem pro lado. Tá, eles olharam pro lado e viram um exclusivo de PC com uma visão de cima e gráficos que pareciam de Mega Drive em pleno 2012. Por que merda tava todo mundo prestando atenção nele, do nada?

Porque ali tinha alguma coisa.

2012 foi um ano estranho pros videogames. Não por ele ter sido ruim (não foi), mas por ter sido diferente do que esperávamos. Fora Mass Effect 3 e, hããã, Resident Evil 6, houve uma significativa escassez daqueles blockbusters motherfucker que fazem meio mundo de gente cair de joelhos e gritar “GAME OF THE YEARRRR!” enquanto ergue as mãos ao céu. Não que não houvessem jogos bons disponíveis, mas não havia uma escolha óbvia, e o público em geral possui uma estranha dependência dessa pseudo-unanimidade. Essa insegurança generalizada é mais uma prova de como a nossa expansiva mídia ainda tem muito a crescer, até que o público se sinta confortável para “pensar” e opinar individualmente.

Mas vai ver essa escassez dos ditos “AAAs” foi algo bom. Fez a galera prestar atenção no mercado indie em um dos seus melhores momentos. Vamos lembra que os indies não são duendes felizes que sentam em pilhas de ouro e fazem jogos só para a sua felicidade: eles buscam (ou tentam) conseguir um retorno como qualquer outra produtora. Mas existe uma, ou melhor, duas enormes vantagens em se trabalhar em um grupo menor: eles usufruem de uma maior liberdade criativa e eles podem definir melhor o seu foco. Eles não tem dois bilhões pra gastar em CG tipo a Square, eles vão fortalecer sua criação em outros aspectos; aspectos bem mais importantes, eu diria. E nesse contexto que Hotline Miami entra.

O forte dos jogos do ano passado (e não coicidentemente, dos indies) foi a narrativa. The Walking Dead fez as pessoas se importarem com as suas escolhas ao ponto de esquecermos que interagíamos com personagens virtuais. Journey emocionou abusando dos sentidos e sem usar palavras. Já Hotline Miami… bom, digamos que ele é tipo o primo macabro de Journey. Que ele também traz emoções, mas são emoções bem diferentes. Tensão, medo, adrenalina. É o tipo de jogo que aguça seus sentidos, te torna alerta, e faz você esquecer o mundo ao seu redor.

A criação do sueco Jonathan “CactusSquid” Söderström é, resumidamente, um simulador de psicopata – um cara sem nome e sem história recebe ligações misteriosas em casa contratando os seus serviços. Vestindo uma jaqueta e uma máscara de animal, seu trabalho é um só: limpe tudo e todos. As comparações com o sensacional Drive são instantâneas, e inevitáveis – ao ponto do nome do diretor estar listado nos agradecimentos especiais. Enquanto você explora os ambientes e pensa em uma melhor estratégia para fazer a limpa, a tela balança de um lado pro outro, cores piscam em néon e um eletropop fenomenal penetra seu cérebro, comandando que ele libere mais adrenalina. Pense em uma versão jogável das viagens psicodélicas de Fear and Loathing in Las Vegas, mas ainda mais insanas e doentias.

Bastões de baseball, canos, metralhadoras e escopetas vão estar espalhados pelo chão, ou serão derrubados pelos inimigos. Cada sala é um puzzle e, tal como em Tetris, as peças são as mesmas, mas o resultado é sempre diferente.  Seu objetivo ainda é o mesmo: só pode sobrar você de pé. Como você vai fazer isso? Você pode ser frio e calculista, indo na surdina e matando um inimigo por vez. Ou pode fazer muito barulho pra chamar a atenção, esperar a galera te caçar e destruir todo mundo ao mesmo tempo em um único frenesi enlouquecido. Ir com cautela aumenta suas chances de sobrevivência, mas ir feito um maníaco vai te dar mais pontos bônus e possivelmente novas máscaras. Meio contraditório, não? O jogo te recompensa por ser descuidado, porque ele quer que você seja.

Hotline Miami é sensacionalmente imersivo e visceral. Você é tão frágil quanto qualquer um dos seus inimigos, e um só tiro pode te abater; e o que decide quem vive ou morre são meros centésimos de segundo. É tenso e emocionante. É essa constante incerteza e luta pela sobrevivência que se repete a cada vez que você morre e aperta o “R” para tentar novamente que torna o jogo tão interessante. Ele nunca é o mesmo jogo duas vezes. É uma experiência tão imersiva pode te levar a um estado de transe gamístico – o que só torna ainda mais grotesco a forma que ele é interrompido, assim que você detona o último inimigo da fase. Nesse momento um aviso vai aparecer, a música vai parar, e você é obrigado a retornar pelo mesmo caminho que veio. A diferença é que agora o lugar está amontoado de corpos, crânios esfaçelados e poças de sangue que você deixou por onde passou. É nojento, grotesco, e ainda assim, impactante.

Hotline Miami é sobre o maior medo da humanidade e a sua única certeza inevitável: a morte. Ele quer que você a experiencie, nos limites possíveis de uma simulação. Ele quer que você a questione, seja de um modo sutil ou completamente explícito. Ele te pôe em uma situação de risco máximo para que cada confronto seja significativo, da frustração ao perder à satisfação ao sobreviver. E é esse perigo constante que torna ele extremamente tenso, imersivo e viciante. Se sair vivo de um confronto frenético é imensamente recompensador, só espere para ver o susto filho da puta que você vai tomar ao ser abatido por um inimigo que você nem sabia que estava ali. Nessa hora talvez você repare que esse não é um jogo como qualquer outro.

Hotline Miami é o mais fascinante e irresistível simulador da última coisa que eu desejaria a alguém.

Disponível para PC, MAC, e recém-lançado para PS3 e Vita, com esquema de Cross-Buy.

Sobre

Rodrigo "Rod" é de Salvador, Bahia. Estuda psicologia mas finge ser comunicador. Acha que entende alguma coisa sobre design de games.
  • caiomota17

    Parabéns, primeira vez que realmente leio um texto daqui e valeu a pena.
    Hotline Miami é um dos poucos jogos que eu joguei que me deu tanta ansiedade e tensão, não como Super Meat Boy, onde é simplesmente frustrante e para conseguir avançar de fase você precisa ser perfeito, e sim, como você bem disse, com um desespero sem noção.
    E é bom saber que mais gente gostou tanto desse jogo como eu 🙂

    Com certeza passarei a frequentar mais o site <3

  • https://www.facebook.com/johnny.welll Johnny Well

    Já me senti tão empolgado com o texto que acabei de comprar na PSN. 10 Doletas com Cross-buy ta ótEmo.

  • http://www.facebook.com/olavofelipe.souzasilva Olavo Felipe Souza Silva

    Excelente artigo sobre esse jogo mágico.
    E só acrescentaria uma característica que nunca vi tão forte em nenhum outro jogo, que é como tudo participa do clima do jogo. O gameplay em si e a música, como foi citado no texto, até as interfaces, a tela de fim de fase, os diálogos escrotos… Tudo funciona perfeitamente bem junto, e isso permite esse jogo ser tão imersivo e fodapacarái.

  • http://www.facebook.com/thiago.salese Thiago Salese

    Uma bela análise! Quero enfatizar que a trila sonora é uma das melhores que já vi em um video game. Combina perfeitamente com o jogo.

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