Qualé a desse tal de… Kirby and the Rainbow Curse

  18/03/2015 - 14:30   kirby, review,  
 

Kirby é a personificação do “ow, me empresta a sua propriedade intelectual aí pra eu testar um negócio”, só que quem pede é a própria Nintendo. Kirby and the Rainbow Curse talvez seja o menos diferente dos spin-offs do personagem, porque ele uma extensão de um conceito já explorado em Kirby Canvas Curse, lançado para Nintendo DS 10 anos atrás (puta que pariu).

Em primeiro lugar, ESSE JOGO É ABSURDAMENTE FOFO. Não só porque ele parece feito de massinha, mas porque tudo no jogo exala fofura. A HUD, a música (de Shogo Sakai <3), o visual. O jogo tenta te agradar no senso estético da melhor forma que pode e nisso ele não deixa a peteca cair.

O problema começa quando você descobre onde vai ter que experienciar tamanha beleza: na tela do Gamepad. Fica bem claro isso quando a primeira instrução que você recebe é “tap to start”. Todos os menus se baseiam na tela de toque, e não é incomum você querer usar alguns dos vários botões do controle para selecionar as opções sem poder. Isso não é necessariamente ruim, porque ainda é consistente, mas todo mundo deve ter uma TV em alta resolução muito maior na qual poderia aproveitar o visual do jogo ao máximo. A caneta fica no Kirby sempre, tornando o Gamepad sua tela principal e a TV um mero acessório para o modo multiplayer.

Os comandos são bastante intuitivos: toque no Kirby para ele ir mais rápido e desenhe uma linha para que ele possa prosseguir por ela. É o mesmo esquema do jogo de DS. A diferença é que no anterior havia a presença de habilidades que podiam ser copiadas dos inimigos, enquanto nesse isso não existe.

O videozinho todo com estética stop motion de início do jogo tenta seu máximo pra deixar claro que essa não é uma aventura só do Kirby, e sim do Waddle Dee junto (ou mais três amigos). Com mais de um jogador, há um segmento em cada fase onde aparece um inimigo que captura o player 1 e que só os outros jogadores podem derrotar. É bem fofa essa tentativa de deixar os amigos mais  importantes, mas também é bem rasa. Por mais que o jogo possa ter sido construído em cima desse multiplayer e no conceito de ter um jogador no Gamepad e outro na TV, na prática ele não é muito funcional. O foco está todo no Kirby e o Waddle Dee fica pouco útil quando o movimento é vertical ao invés de horizontal, visto que ele não tem pulo infinito e não consegue escalar as linhas da mesma forma que o Kirby. Não deixa de ser divertido e é um bom passatempo com pessoas que talvez tenham menos paciência com jogos, mas poderia ter sido melhor explorado.

Há uma nítida diferença na filosofia de design desse jogo e do anterior. Enquanto Rainbow Curse dá mais ênfase ao local e ao cenário, Canvas Curse se preocupava mais com o layout e o desafio. Não que o de Wii U não tenha fases fantásticas. Temos, por exemplo, a que você vira um foguete e tem que planejar com a stylus  uma rota de fuga, passando por todos os painéis de ativação da porta de saída e depois seguir essa rota desenhada no jogo com um tempo limite; ou ainda a que se passa em um navio assombrado com fantasmas que podem te matar com um hit. Mas elas em sua maioria parecem mais como um passeio quando comparadas com as de DS, no qual as fases passavam a impressão de serem mais bem construídas e de sempre te jogarem desafios novos a cada segundo, como uma pista de obstáculos.

Curiosamente, apesar disso, o jogo faz um trabalho muito bom em te ensinar as mecânicas de cada fase sem precisar de muitos tutorias (não que eles não existam). Por exemplo: há uma fase em que uma parte da parede ao fundo é de uma cor levemente diferente, indicando claramente vai acontecer algo com ela. Mesmo assim, o jogo coloca um inimigo logo à frente perto de uma dessas paredes, mostrando como ela cai nele quando ele a atravessa. Toda essa cena é bem na frente do jogador da forma mais orgânica possível. Você pode até tentar alcançar o inimigo antes disso, mas esse cenário foi feito para que isso seja humanamente impossível por muito pouco. Os level designers têm plena noção do timing do jogador e como ele vai experienciar as coisas, o que me deixa perplexo em como todo esse conhecimento não foi utilizado nos estágios inteiros, e não só em algumas porções deles.

Como esse review saiu bem tarde, aproveito esse finalzinho para comentar as análises conflitantes quanto a esse jogo. Algumas publicações acharam o jogo fraco, enquanto outras disseram que tava bom sim. Quando comecei, de fato não conseguia entender o que o levou a ter tal repercussão negativa, mas depois, organizando as ideias para escrever esse texto, eu comecei a notar que tudo que amei nesse jogo tem a ver com a sua parte artística, mais do que com o jogo em si. Não tem nada de mais certo ou errado nisso, depende mais das prioridades de cada um. Para mim a junção de direção de arte e música compensa uma mecânica ou problemas que outras pessoas possam ver como mais graves. Isso não significa que esses problemas não estão ali e não devam ser apontados, mas casos  de opiniões divergentes assim são interessantes de se ver.

Kirby and the Rainbow Curse é um caso de “jogo de artista”, onde o jogo foi mais construído em cima da estética do que do gameplay em si, que foi deixado um tanto de lado. Fora que ele também reside em um sistema com crise existencial, onde parece que ninguém sabe muito bem o que fazer com o seu controle diferenciado no momento. Limitar a visão do jogador para apenas o Gamepad é completamente frustrante e nesse caso não há solução para isso, ou esse jogo seria feito para o 3DS – que teria um problema parecido considerando que apenas a tela superior ser 3D e é maior que a de baixo – ou ele simplesmente não existiria.

No final das contas, Kirby and the Rainbow Curse é um jogo bem divertido, mesmo contando com suas falhas e tendo sido lançado para um console que não se entende direito.

Kirby and the Rainbow Curse está disponível para Wii U.

Sobre

Luiggi "Afro" Ligocky é um pseudo-artista que estuda a área de jogos digitais. É um adorador de jogos japoneses e bizarros desde a época em que ganhou seu Super Nintendo. Grande fã da Nintendo, Konami e Sega.
  • matestinha

    Fiquei um pouco chateada quando assisti a primeira cutscene e voltei pro meu gamepad e não tava tudo lindo naquela mesma resolução maravilhosa 🙁 porém que jogo lindo né?

  • http://thestilado.blogspot.com Nohan Gonzalez

    Talvez o jogo tenha sido uma experimentação sim, mas não de novas mecânicas. Claymation não é uma coisa que se vê o tempo todo em jogos, e pode ter sido um desafio novo pros artistas e desenvolvedores. Talvez eles também quisessem testar como o público reagiria a um jogo de console onde você joga quase que exclusivamente olhando pro gamepad.

    Só não aceito ainda que o Kirby não consiga pegar poderes dos inimigos nesse jogo 🙁

    • Luiggi Ligocky

      Pior que nesse caso especifico eu gostaria muito de um Kirby convencional com esse estilo de arte.

  • Flavio

    Jogo de artista, que foi construído mais em cima da estética que do GamePlay. Me veio Child of Light na cabeça. Será que procede? Não que ele seja um game ruim, mas sua estética e narrativa em poesia chamam mais atenção que o RPG em si, pois no final eu já estava pulando algumas batalhas, e percebi que não havia usado alguns personagens da party. Mas estava amando toda a estética e narrativa

    • Luiggi Ligocky

      Infelizmente não joguei Child of Light, mas pode ser que sim, porque sempre que escuto sobre ele o primeiro comentário é “lindo demais”. No final o gimmick de gameplay vai perdendo a graça mesmo e a moral é só aproveitar os cenários e as musicas.

      • http://www.juizcachorro.com/ Roberto Rezende

        se bem que, até aí, esse ano você vai passar ouvindo que Ori é “lindo demais” e mesmo assim ele possui um ótimo gameplay. Quero dizer, o jogo pode ter uma estética extraordinária e ser descrito inicialmente por ela porque este é o elemento mais visível em um videogame. Não sei se é o caso do Child of Light, pq só joguei alguns minutos dele.

        • Luiggi Ligocky

          Concordo! Mas é que no caso de Child of Light eu já tinha escutado que era meio fraquinho mesmo da as pessoas ficavam só no “É bem bonito” mesmo ahaha

  • Gustavo Cardoso

    Eu sempre dou muito valor a junção de parte artística + sonora, mas percebi na prática que apenas isso não me segura em um jogo, como no caso de Bioshock Infinite. Por algum motivo a jogabilidade não me prendeu da forma que eu queria (e tb quero aprender mais de game design pra saber o porquê disso) e acabei largando na metade, mas com um remorso enorme pq foi uma das melhores direções artísticas que já vi em um jogo…

    • muaddib

      O jogo, apesar da estética, tem uma jogabilidade MUITO oldschool, que te remete a Duke Nukem 3D, Quake, Doom, Wolfenstein…
      Eu gosto pracaralho, MESMO desse jogo, não tem noção. Mas as vezes a jogabilidade e o visual do jogo entram em conflito, e você se sente jogando Duke Nukem.

  • Cainã Perotti

    Só passei pra dizer que essa review está ótima, muito bem escrita, tudo muito bem analisado e puta que pariu, 10 anos? É muito tempo.

  • Caio Oricchio

    pelo seu review, eu acho que esse podia ter sido lançado meio que como “arcade”, só via download, em vez de um jogo completo. daí o fato de ser focado demais no gamepad e ter experimentalismos que falham às vezes não seria tão gritante, porque todos esperavam A EXPERIENCIA DEFINITVA DE KIRBY EM 1080P porem parece não ser o caso =/ mas eu acho que jogarei pela estética e por essas sacadas de ensinar tutoriais que você falou.

    • Luiggi Ligocky

      Bom, ele é um dos jogos mais baratos de Wii U, o preço normal dele é 40 dolares. Mas concordo, podia ser um pouco menos e só download pra acentuar mais o experimento

  • César Hoffmann

    eu quero 🙁

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