A narrativa dos combates de Undertale

AVISO: O texto abaixo tem uma porrada de spoilers de Undertale e honestamente jogar Undertale com spoilers não é legal, é altamente recomendável que você tenha feito pelo menos um final do jogo antes de ler. Sério, joga lá, o texto não vai sair daqui.

Em um certo ponto em Undertale você encontra um inimigo chamado “Tsunderplane”, que como o nome indica é um avião tsundere. Undertale talvez seja o primeiro jogo a usar a palavra tsundere explicitamente então é bom eu explicar que, tsundere é como o pessoal costuma chamar aqueles personagens de anime que gostam de outro personagem mas não admitem e as vezes são até hostis para fingir que não gostam. Enfim, o tsunderplane gosta do jogador mas é hostil por ser tsundere e ataca usando aviõezinhos.

Assim como todos os outros inimigos do jogo, ele tem um ataque único e temático: aviões, já que ele é um avião. Mas uma vez que você tenta se aproximar dele usando o comando “approach”, ele ataca usando aviões com um contorno verde. Undertale é um jogo bastante consistente com as suas regras e o tsunderplane é um inimigo que você só encontra perto do final do jogo, quando você já está cansado de saber que ataques verdes recuperam a vida do jogador e que é bom você encostar neles. E é exatamente o que você precisa fazer pra deixar o tsunderplane envergonhado e vencer a luta de forma pacífica.

tsunder

Resumindo: quando você “se aproxima” do monstro ele demonstra um sentimento com o contorno verde, que incentiva o jogador a se aproximar, mas só um pouco, só o suficiente pra deixar o Tsunderplane envergonhado, se você se aproxima demais, você encosta na parte branca e sofre dano do ataque.

O jogo usa a “tsunderezice” do personagem na mecânica de ataque dele. Legal né?

Undertale é um jogo relativamente curto pra um RPG e não tem um numero muito grande de inimigos mas os que tem são de coração. Todos são únicos e tem mecânicas diferentes que servem pra deixar o modo pacifico do jogo mais interessante e também pra dizer alguma coisa sobre eles, passar alguma mensagem ou até fazer uma piada mesmo.

Os irmãos esqueletos Papyrus e Sans atacam de forma parecida, usando ossos. Assim como o casal Asgore e Toriel, que atacam usando pequenas bolas fogo. Toriel no entanto, erra todos os ataques quando o jogador está com pouca vida, mostrando que ela não tem coragem de matar o personagem. Sem ninguém falar nada, se o jogador também usa o comando “fight” mas erra os ataques, uma hora ela percebe que o jogador também não quer lutar e a luta acaba.

Undyne avisa o jogador que ele tem que parar de correr e que o único jeito de vencer é aprendendo a encarar o perigo de frente. A luta dela é a unica em que o jogador não tem que desviar dos ataques mas sim se defender, movendo o direcional pra mesma direção do ataque, ou seja, encarando ele de frente.

undyne

Muffet é uma aranha que diz que está te atacando porque precisa de dinheiro pra ajudar as outras aranhas. Elas vendem pães e doces em alguns lugares do jogo mas aparentemente o lucro não é suficientes. Ao que parece as aranhas também gostam de dançar porque a todo instante durante a luta, você é informado que as aranhas estão batendo palmas ou dançando de forma sincronizada junta com a Muffet. E sendo uma aranha e isso sendo um video-game, é esperado que ela te prenda em uma teia pra limitar seu movimento, né? Considerando o tema musical, também faz sentido que essa teia seja formada por linhas horizontais, como uma partitura, certo?

Bom, é isso que ela faz:

muffet

Ela também te ataca com croissants e rosquinhas já que ela faz essas coisas pra vender, dá uma aliviada nos ataques se você der uma grana já que ela precisa de dinheiro e encerra a luta se você usar um item comprado das aranhas que estão espalhadas pelo jogo. Afinal o importante pra ela é o dinheiro pra ajudar as aranhas e ela respeita a sua clientela.

Por fim, Flowey, a luta mais bizarra do jogo e o maior spoiler deste texto. Sério, se você ignorou o aviso do inicio e veio até aqui, fecha esse texto agora cara.

 

Flowey tem um estilo de arte diferente de todo o resto do jogo, colorido e realista. A musica dele também é unica no jogo inteiro, fugindo do chiptune melódico e caindo em um dubstep caótico que não lembra nada o resto da trilha do jogo. Isso tudo, assim como o HAHAHAHAHAHA fechando o jogo na sua cara, são pra causar um choque no jogador que certamente não estava esperando nada daquilo.

Porém, os seus ataques continuam consistentes com o resto do jogo. Você ainda tem que desviar deles como sempre e depois de um tempo cada uma das almas que ele está usando começa a te atacar.

Você não consegue atacar Flowey diretamente, mas consegue agir quando as almas (cujos ataques são brancos como os do resto do jogo) te atacam. A ideia aqui é que você convença todas as almas de forma pacifica a te ajudar a lutar contra o Flowey. Mas de quem são essas almas?

Bom, o padrão de ataque delas a principio parecem coisas aleatórias: facas, luvas, sapatilhas de balé, cadernos, frigideiras e uma arma. Mas se você der uma olhada no seu equipamento vai notar que essas são as “armas” que você encontra ao longo do jogo. Ou seja, os equipamentos que você encontra são itens usados pelos donos das almas aprisionadas ali, que são pessoas que também caíram na montanha e morreram antes de você.

Em nenhum momento o jogo diz isso explicitamente. Mas é tudo deduzível através do combate.

É normal a gente prestar atenção nas mensagens que um jogo passa através dos textos, dos diálogos e das cutscenes mas essas não são as únicas maneiras de se contar uma história. O cenário, as mecânicas e até a dificuldade, entre outras coisas, podem ser usadas pra explicar detalhes do lore ou reforçar uma mensagem que um jogo está tentando passar.

Jogos de luta em geral costumam dar golpes parecidos pra indicar que dois personagens tem um parentesco ou um mesmo mestre, da mesma forma que Sans e Papyrus. A série Metal Gear tem vários chefes com mecânicas que refletem a sua personalidade e exigem que o jogador pense fora da caixa. Dark Souls usa os cenários, itens e até a sua dificuldade pra dar mais detalhes do lore, assim como Undertale (a infame run genocida tem seus motivos pra ter chefes extremamente difíceis).

Entender e saber usar estes recursos únicos dos jogos é essencial pro crescimento da mídia como arte e ver que Toby Fox, o criador de Undertale, entende muito bem tudo isso me deixa feliz…

Feliz a ponto de escrever 3 parágrafos sobre um avião tsundere.

Tuba

Sobre

Arthur “Tuba” Zeferino é co-criador do site, programador e brother indie.

Visit the best review site wbetting.co.uk for William Hill site.