De fato a pergunta do título é bastante pertinente. O que é esse Smash Bros, afinal? Já me flagrei com dificuldade para responder a essa pergunta em mais de uma ocasião.
É um jogo de luta reunindo personagens da Nintendo?
É um party game descompromissado ideal para entreter a rapaziada durante festejos?
É um jogo que estimula um cenário competitivo através da profundidade das suas mecânicas?
Smash Bros é tudo isso listado acima. É também o jogo onde um macaco de gravata acerta um cruzado na cara de uma raposa antropomórfica de jaqueta em uma arena suspensa no espaço sideral. E, agora, Smash se esforça para ser também algo que nunca foi: um jogo portátil. Se antes eu achava que Super Smash Bros. for 3DS era um título genérico e redundante, agora vejo que ele te diz exatamente o que esperar do jogo.
Poderes cósmicos fenomenais (dentro de uma lampadazinha)
Há uma diferença considerável entre a experiência de reunir a galera no sofazão da sala e distribuir os controles para jogar em uma TV de 42 polegadas, e a de ter um jogo multiplayer que pode te acompanhar também no caminho do trabalho ou na fila do pão. Essa diferença se reflete (ou ao menos deveria se refletir) na filosofia de design do jogo, de acordo com a sua plataforma. Quando os desenvolvedores prestam atenção nisso (e a Nintendo tem tradição em fazer bem esse tipo de distinção), a produção para portátil de uma série que sempre figurou em consoles de mesa não vem sem adaptações.
Um jogo portátil tem a tendência de ser muito mais pessoal, esporádico, propício para sessões mais curtas. No 3DS a sua cópia de Smash Bros funciona menos como a pista de dança onde você recebe a galera em uma festa repleta de passos de Grease, e mais como o aposento privado onde você pratica os movimentos na frente do espelho. Não há necessidade, por exemplo, de um Tournament Mode elaborado ou um editor de fases, ambos confirmados na versão de Wii U.
Para ilustrar melhor essa diferença na abordagem, vamos nos concentrar no modo Smash Run, inédito e exclusivo dessa versão de 3DS. Ele é essencialmente um modo multiplayer (mesmo jogando sozinho você compete com outros 3 personagens controlados pelo computador), mas tem funcionalidade e consequências muito mais individuais. Explicando de forma resumida, os quatro participantes começam em pontos distintos de um mapa consideravelmente grande e têm cinco minutos para explorá-lo, derrotando inimigos e caçando baús para acumular pontos de status (ataque, especial, velocidade etc) e prêmios (normalmente itens equipáveis e golpes para movesets alternativos). Terminado o tempo, começa uma disputa entre os participantes em modalidades variadas, cada uma exigindo mais de algum atributo específico – desnecessário dizer que os status acumulados na primeira etapa são usados nessa disputa.
Veja bem, você passa cinco minutos explorando um mapa como em um sidescrolling convencional (não tão diferente do modo Subspace Emissary, do Brawl), e, exceto pela possibilidade aleatória de esbarrar alguém no caminho, faz isso sozinho. Os prêmios que cada jogador coleta durante a partida são dedicados a customizações e aquisições de troféu que dizem respeito apenas ao jogo de cada um. Percebe? É um modo multiplayer cujas implicações são muito mais individuais do que coletivas. Com razão ele é exclusivo de 3DS: tudo nele reflete as adaptações da experiência de Smash Bros para um portátil – e não é surpresa que o modo exclusivo de Wii U, Smash Tour, promova uma farra mais coletiva, simulando um jogo de tabuleiro.
Anistia para os profissa
O lance dos pontos de status variados cumpre também outra função: ao permitir que seus atributos sejam traduzidos em nomes e barrinhas, o jogo abre mais uma porta de entrada para qualquer um que queira se aprofundar em suas mecânicas. Porque não é difícil sacar a partir disso que essas barrinhas acima existem também para determinar os pontos fortes e fracos de cada personagem, mesmo que elas estejam invisíveis. É da dedução intuitiva desses atributos que saem as tier lists, counter picks e outras firulas típicas em jogos de luta competitivos.
E, bem, já que estamos falando de competitivo, não dá pra ignorar a forma como essa possibilidade foi abraçada. Porque jogar Smash Bros “a sério” foi sempre algo meio clandestino, e boa parte das ditas técnicas profissionais de Smash Bros Melee são gambiarras que fogem um pouco da proposta inicial. Agora o jogo foi projetado e rebalanceado prevendo essa possibilidade, considerando-a oficial.
Se tem essa galera que gosta de disputar habilidade sem itens interferindo, vamos botar um modo online só pra eles;
Se tem uns renegados jogando só na Final Destination, põe uma versão igualmente plana pra todos cenários, porque a gente não se matou fazendo todos esses backgrounds e texturas de bobeira;
Se tem uns engraçadinho que fica agarrado na borda do cenário pra ganhar frame de invencibilidade ou evitar recuperação do inimigo, chega, acabou a putaria.
Só é importante frisar que abrir espaço para abraçar a ideia de que o jogo seja apreciado competitivamente é bem diferente de oficializar as tais gambiarras que resultaram em técnicas no passado. Não vem achando que o Sakurai canonizou o wavedash, porque você sairá frustrado. No geral, o que rolou foi prever que uma partida “séria” seja mais justa e tornar o jogo um pouco mais rápido, deixando tudo em um meio termo bastante agradável entre a freneticidade hardcore do Melee e a descompromissada casualidade do Brawl (adeus tropeços). Acho muito válido, mas só o tempo dirá se a comunidade vai realmente se adaptar e se um cenário competitivo expressivo sairá daí.
Meet Nintendo (e grande elenco)
Há outra coisa que Smash Bros é, e isso desde o surgimento da série: uma homenagem. E quem é o homenageado, você pergunta? A trajetória da própria Nintendo, abrindo espaço para que uns convidados especiais (Sonic, Mega Man e Pac-man) aproveitem a festa também.
A tela de seleção de personagens, complementada pela vasta quantidade de troféus, tem ares de excursão por uma galeria de arte. Há uma história ali que transcende qualquer narrativa que o jogo em si pudesse carregar. Do Mr. Game & Watch à Wii Fit Trainer, a Nintendo ostenta orgulhosa o legado que vem acumulando ao longo das décadas. Não é difícil se apegar ao jogo apenas pelas suas mecânicas e possibilidades, ainda mais em grupo – ele ainda é muito bom em si – mas a experiência que Smash proporciona não está completa se você for imune à maioria das referências, reverências, detalhes pequenos e grandes, que chegam em quantidade e velocidade quase criminosas para tentar te fisgar pela nostalgia.
Toda essa overdose de fanservice poderia soar forçada, gratuita, masturbatória, mas o conjunto parece tão coeso que é difícil imaginar uma reunião de tantos universos icônicos sendo realizada de forma mais natural.
Only for Nintendo 3DS
Super Smash Bros for 3DS, como comentei, entrega justamente o que propõe. É Smash Bros… para 3DS. O que implica em uma iteração que opera dentro das limitações e possibilidades únicas do sistema. Não é o melhor que a série tem oferecer, visto que ela continua funcionando melhor em um console de mesa, mas é um esforço sincero para entregar a melhor experiência possível no portátil, sem se conformar em simplesmente portar um jogo projetado para outro tipo de plataforma.
Em seu quarto jogo, Smash Bros parece ter amadurecido a ponto de definir com mais firmeza a sua identidade, buscando harmonia com os diferentes tipos de público que ela abrange, mas sem abrir mão da flexibilidade, brincando com a própria fórmula e trazendo cada vez mais modos e conceitos novos.
Se o que você precisava pra vencer o tédio da fila do banco era arremessar um taco de baseball na cara de um dinossauro de botas, não há melhor opção no mercado.
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